A infância de boa saúde vai para o hospital

A candidatura da Misericórdia de Almeirim ao Fundo Rainha D. Leonor foi aprovada. O Fundo, uma iniciativa da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, destina-se a apoiar projectos de outras Misericórdias que, por falta de meios, correm o risco de ficar no papel. O Fundo é financeiramente suportado pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, apesar de ser também parceira a União das Misericórdias. Almeirim candidatou a conclusão da obra de recuperação do antigo hospital. O edifício que se degradava, sofreu uma primeira intervenção em 2012 para substituição da cobertura e reforço estrutural. Em 2014 / 2015, uma candidatura aos fundos de coesão, permitiu concluir o primeiro andar, onde ficará a creche para 99 crianças dos três meses aos 3 anos. Agora, a projectada intervenção, permitirá recuperar o rés-do-chão, onde ficarão instaladas a cozinha do complexo, o refeitório e sala multiusos, os gabinetes da direcção pedagógica, bem como salas de jardim-de-infância. O Fundo Rainha D. Leonor apoia a obra com 221.083,83€ que permitirá reabrir um espaço onde também nasceu Almeirim. Este espaço conjuga-se com o também novo projecto de recuperação da designada Cerca do Hospital, projecto paisagístico desenvolvido para conter um recreio das 300 crianças. “A Misericórdia de Almeirim reabre um espaço onde as crianças nasciam para agora as ver crescer em idade, sabedoria e, espera-se graça”, são as palavras do Sr. Provedor que também fez questão de manifestar o agradecimento ao seu colega Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa por esta extraordinária iniciativa de partilha dos seus meios. Ao empreiteiro, que havia ganho a obra de recuperação global do edificado, e cujos trabalhos estavam suspensos, por incapacidade financeira da instituição, já foi dada ordem de reinício esperando-se, assim, que seja possível, ainda este ano, abrir a creche e o jardim-de-infância. O “hospital” como sempre será conhecido, é uma construção tradicional que se começou a desenhar nos primórdios do século XX, de que não temos a data exacta, com uma arquitectura sóbria, de vãos altos, marcantes, estruturada em alvenaria e madeira, com belos soalhos onde hoje apenas se imaginam, os cheiros às ceras de antanho, mesclados com o do éter. Bem como os silêncios dos largos corredores onde os pacientes esperavam a solenidade do acto médico. Desse tempo se recordam os hábitos azuis das competentes freiras alemãs, Missionárias do Precisíssimo Sangue, que de forma discreta, mas próxima, praticavam a cura das maleitas físicas com o conhecimento técnico, mas também o apoio ao espirito já não com saber, mas com sabedoria. Como hospital abriu apenas em 1956 tendo posteriormente iniciado a sua valência, como hoje se diz, de maternidade. Assim funcionou até que a revolução de 1974 interditou a operação das unidades saúde aos privados e o Estado se apropriou do hospital. Os hábitos das freiras foram trocados belas batas brancas, mas manteve-se ao serviço da população. A capacidade de trazer almeirinenses ao mundo encerrou em 6 de Abril de 1985 sendo o último choro de bebé anunciante da boa nova, o do André Filipe, filho de dois conhecidos almerinenses – a professora Alda Sardinheiro Almeida e Manuel Almeida. Nesta altura encerrou a unidade hospitalar mantendo o seu funcionamento, apenas, em ambulatório – centro de saúde. Esta situação manteve-se até 28 de março de 2000 data da abertura do novo centro de saúde. A dimensão do espaço e a desadequação às novas exigências das unidades de saúde levou ao repensar da sua utilidade. Foi decidido manter-se ligado ao som das crianças, das suas brincadeiras e do desenvolvimento dos seus sonhos. Os pais e avós que aqui nasceram vão voltar, com a sua descendência, relembrando outros tempos, mas também de que somos apenas um elo na cadeia do tempo.As batas brancas foram substituídas por bibes, multicolores, menos imaculados no fim de um dia de brincadeira, mas com funções igualmente terapêuticas.

 

 

Redigido no antigo acordo ortográfico